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sábado, 28 de agosto de 2010

Transtorno Bipolar do Humor

O transtorno bipolar do humor é uma doença caracterizada por oscilações do humor e do comportamento.

O transtorno bipolar não é uma doença nova. Há registros de que na Grécia antiga, já havia uma doença que evoluía da melancolia para a mania. Esse conceito permaneceu até o iluminismo europeu dos séculos XVII e XVIII, quando foram descritas várias entidades nosológicas de evolução cíclica ou periódica, como a loucura circular e a loucura de dupla forma, nos termos de Yuan-Pang Wang (2008).

No final do século XIX, ocorre um grande marco histórico para o entendimento do transtorno bipolar, quando Kraepelin, um psiquiatra alemão, separou as psicoses em dois grandes grupos (demência precoce e insanidade maníaco-depressiva), como bem elucida Del Porto, na revista brasileira de psiquiatria. Ao final de seus trabalhos Kraepelin conceituou a “insanidade maníaco-depressiva” e colocou especial ênfase nas características da doença que mais claramente a diferenciavam da demência precoce: o curso periódico ou episódio, o prognóstico benigno e a história familiar de quadros homólogos (maníaco-depressivos). O nome da doença evoluiu para “psicose maníaco-depressiva” e Del Porto lembra ainda que as classificações nosológicas atuais (DSM, CID 10) baseiam-se, em linhas gerais, ainda nos preceitos de Kraepelin.

O nome “psicose maníaco depressiva” foi substituído pelo termo Transtorno Bipolar do Humor, em razão de que na maioria das vezes os sintomas psicóticos não aparecem. Hoje, o transtorno bipolar é considerado um transtorno do humor, assim como a depressão unipolar, por exemplo.

O humor normal flutua. Quem não oscila entre alegria, tristeza, raiva, excitação? Para que essa variação seja considerada saudável é necessário, entretanto, que ela seja proporcional ao seu foco gerador, à situação que deu causa a oscilação.

No transtorno bipolar, aliás essa é sua característica mais marcante, ocorre uma alternância de estados de humor, onde há uma flutuação entre DEPRESSÃO e MANIA. Há ainda o chamado ESTADO MISTO.

DEPRESSÃO
A depressão do transtorno bipolar apresenta as mesmas características da depressão unipolar:

Perda de energia;

Baixa no estado geral de humor;

Cansaço físico ou psíquico;

Dificuldades de atenção, concentração e memória;

Pensamentos negativos;

Pessimismo;

Baixa auto-estima;

Baixa da libido;

Insônia ou sono em excesso;

Perda ou aumento de apetite.

MANIA

A mania do transtorno bipolar é uma espécie de euforia, onde o sujeito apresenta uma alta em seu estado geral de humor, com as seguintes características básicas:

Energia elevada;

Irritabilidade;

Aceleração física e/ou psíquica (aqui há uma aceleração do curso dos pensamentos);

Fala acelerada e exagerada;

Hiperatividade;

Pensamentos positivos;

Aumento da libido;

Muitas idéias;

Grandiosidade (falta de medo, sentimento de superioridade...)

ESTADO MISTO
No estado MISTO, o sujeito oscila entre depressão e euforia em 24hs ou pode haver, nos termos de Doris Moreno (2008), uma superposição de sintomas depressivos e maníacos, o que resulta em:

Alta ansiedade;

Desespero;

Angústia;

Aflição;

Irritabilidade;

Aceleração;

Agitação + lentificação (física/mental);

Aumento dos impulsos;

Aumento da fome;

Aumento do uso de álcool e drogas;

Aumento de sintomas obsessivo-compulsivos;

Insônia grave ou trocar o dia pela noite.

ESPECTRO BIPOLAR

As variações do espectro bipolar, nos termos de Diogo Lara (2009), são:

Tipo I: aqui temos o bipolar clássico, que oscila do pico mais elevado da mania para a depressão mais severa.

Tipo II: aqui existe uma predominância do estado depressivo. A fase maníaca é branda e é chamada de hipomania. O diagnóstico não é simples e muitos bipolares do tipo II são tratados como portadores de depressão unipolar.

Tipo III: esta classificação é usada quando a fase maníaca foi induzida por uso de antidepressivos ou psicoestimulantes, ou seja, o paciente faz parte do espectro bipolar, mas o pólo positivo foi descoberto pelo uso das drogas.

Tipo IV: aqui, elucida o autor, estão os bipolares que nunca apresentaram mania ou hipomania, mas que tem um histórico de humor mais vibrante, na faixa hipertímica. A fase depressiva geralmente tem características mistas.

CAUSAS DO TRANSTORNO BIPOLAR

Mas o que causa o transtorno bipolar?

Há estudos comprovando existir um forte componente genético aliado a fatores ambientais. Isso significa dizer que para desenvolver o transtorno bipolar do humor o sujeito precisa ter uma predisposição genética para tanto. Mas, isso não é suficiente. Aliada a essa predisposição genética existe o ambiente. Este se traduz por vivências e experiências do sujeito, desde o nascimento e principalmente no âmbito da família, já que nossas primeiras interações são com os pais e familiares. Quando o ambiente é hostil e desfavorável, as chances de desenvolver a doença são muito maiores.

TRATAMENTO

O tratamento do transtorno bipolar se dá, basicamente, por duas vias:

Psicoterapia - sob a responsabilidade de um psicólogo;

Psicofarmacologia - sob a responsabilidade de um psiquiatra.

A psicoterapia se faz extremamente necessária, principalmente no sentido de ajudar o paciente a aderir ao tratamento.

Há estudos comprovando a eficácia da terapia cognitiva no tratamento do transtorno bipolar. A terapia familiar também é útil, pois o transtorno bipolar envolve hereditariedade e quando um membro da família é identificado como portador do transtorno é preciso atenção, pois outros membros podem ser bipolares.

Quanto à psicofarmacologia, vários tipos de medicamento são utilizados no tratamento do transtorno bipolar, tais como:

Estabilizadores do humor - aqui o fármaco mais comum e conhecido é o lítio;

Antipsicóticos - esta classe de medicamentos tem sido amplamente utilizada e temos como exemplo: clozapina, risperidona, quetiapina dentre outros.

ENDEREÇOS ÚTEIS:

INSTITUIÇÕES NACIONAIS:

ABRATA – Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos.
Av. Paulista, 2644
São Paulo – SP

GRUDA – Grupo de Estudos de Doenças Afetivas – FMUSP
Rua Ovídio Pires de Campos, 225M
São Paulo – SP

Projeto Fenix

PRODAF – Programa de Distúrbios Afetivos e Ansiosos – UNIFESP
Rua Botucatu, 416 – Vila Mariana
São Paulo – SP

INSTITUIÇÕES INTERNACIONAIS:

Juvenile Bipolar Research Foundation

International Society for Bipolar Disorders



Direitos autorais reservados.

KARINA ALECRIM BESSA

domingo, 22 de agosto de 2010

Semana do Psicólogo



Nesta semana, no dia 27 de agosto, comemoraremos o Dia Nacional do Psicólogo. Há 48 anos, nesta mesma data, a profissão foi regulamentada pela Lei 4.119/1962. Desde então, a psicologia vem crescendo e ganhando seu espaço na sociedade brasileira, mostrando seu comprometimento ético com o modelo biopsicossocial de saúde.

A palavra psicologia tem origem em duas palavras gregas: psique (alma) + logos (estudo/ciência). Assim, psicologia significa “estudo da alma/mente humana”.

Parabéns a todos os psicólogos, psicólogas e estudantes de psicologia, que comprometidos com a ciência e a ética contribuem a cada dia para que se conheça um pouco mais acerca dos fenômenos do psiquismo humano, podendo assim oferecer intervenção e auxílio adequados àqueles que, em sofrimento psíquico, os procuram.

Oração do Psicólogo

Senhor,
facilita-me um conhecimento mais
profundo de mim mesmo para que eu
possa reconhecer o outro na sua plenitude;
permita-me ver o homem que está
diante de mim, para que eu possa ajudá-lo a
ver o que está em si;
possibilita-me um discernimento mais
abrangente, para que eu possa ajudar o
homem a resgatar a sua identidade
e o seu significado;
dá-me humildade para que eu possa
reconhecer os meus erros e os meus
limites, pois só assim poderei
transcendê-los;
ilumina esse nosso encontro, para que
possamos crescer juntos;
e bem aventurados os que podem
penetrar a natureza humana e
compreende-la;
e bem aventurados os psicólogos, que
tem a  benção de Deus, nesse
encontro com o outro.

(autor desconhecido)



KARINA ALECRIM BESSA

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Saber Viver - Cora Coralina

Saber Viver



Não sei... Se a vida é curta
Ou longa demais pra nós,
Mas sei que nada do que vivemos
Tem sentido, se não tocamos o coração das pessoas.
Muitas vezes basta ser:
Colo que acolhe,
Braço que envolve,
Palavra que conforta,
Silêncio que respeita,
Alegria que contagia,
Lágrima que corre,
Olhar que acaricia,
Desejo que sacia,
Amor que promove.
E isso não é coisa de outro mundo,
É o que dá sentido à vida.
É o que faz com que ela
Não seja nem curta,
Nem longa demais,
Mas que seja intensa,
Verdadeira, pura... Enquanto durar.

Cora Coralina, poeta brasileira
(1889-1985)


KARINA ALECRIM BESSA

sábado, 14 de agosto de 2010

Exercício Físico e Bem Estar Psicológico

Nos dias atuais são inúmeras as pessoas que sofrem de algum transtorno de ansiedade ou de humor.

A vida moderna, todos os avanços tecnológicos que vivenciamos nos últimos tempos, desde, por exemplo, o advento do automóvel até a internet transformaram consideravelmente nossas vidas. É inegável que poder sair de um ponto a outro de carro no lugar de montado a cavalo, como faziam nossos antepassados, é muito mais confortável. Mas, também é inquestionável que o trânsito nos grandes centros urbanos é um grande fator de estresse.

Vejamos o exemplo da própria internet. Por um lado é maravilhoso estar conectado em rede mundial, viver num mundo globalizado, acompanhar notícias em tempo real e desfrutar de todos os benefícios trazidos pela rede, como, por exemplo, escrever um blog. Por outro lado todos nós sabemos da preocupação que a internet gera nos pais de família, por exemplo.

A Organização Mundial de Saúde, nos traz que o índice de pessoas que sofrem de transtornos de ansiedade e depressão nos grandes centros urbanos é muito maior do que o das pessoas que vivem em pequenas cidades. Isso porque aliado a todo o aparato tecnológico, existem as preocupações da vida moderna que abrangem não só trânsito, mas também a violência urbana, o desemprego, dentre outros tantos fatores.

Assim, diante desse cenário, nós percebemos as manifestações dos mais diversos transtornos ansiosos. São os ataques de pânico, as fobias específicas e sociais, o TOC, o estresse agudo e pós-traumático, a ansiedade generalizada, para citar alguns. Bem como os quadros de depressão. É importante colocar aqui que a ansiedade e a depressão, embora apareçam muito em conjunto, elas possuem uma característica diferente. A depressão é sempre patológica. Já a ansiedade não. A ansiedade ao contrário da depressão é um espectro normal da vida do ser humano. É a ansiedade, por exemplo, que nos alerta contra os perigos para que possamos nos proteger e garantir nossa segurança. Mas, quando ultrapassa certos níveis, quando se torna desproporcional ao foco gerador, aí sim a ansiedade torna-se patológica e é um dos sinais mais evidentes de sofrimento humano.

O tratamento, tanto da ansiedade quanto da depressão, é feito de duas maneiras. Uma é o tratamento psicoterápico, que é realizado por um psicólogo. Mas, em algumas situações, há a necessidade de aliar a psicoterapia ao tratamento medicamentoso. Esse tratamento é feito por um médico psiquiatra, que trabalha em conjunto com o psicólogo.

O interessante, e é sobre isso queremos falar hoje, é que atualmente já existem estudos que provam que a prática regular e coordenada de exercícios físicos pode ser eficaz no auxílio do tratamento da depressão e da ansiedade. Não significa que apenas praticando exercícios o sujeito vai ficar livre da depressão ou de algum transtorno de ansiedade, seja pânico, estresse pós-traumático, ou qualquer outro. Mas, a prática de exercício físico vem se tornar um terceiro elemento terapêutico, ao lado da psicoterapia e da medicação. Vale ressaltar que os resultados alcançados pelos pesquisadores que se dedicaram a esse estudo foram muito positivos.

Nós sabemos que a depressão é um transtorno do humor. Então se a prática de exercícios físicos é eficaz no tratamento da depressão, também podemos concluir que a prática de exercícios físicos atua sobre o estado de humor do sujeito.

Mas, o que é humor? Humor pode ser definido como um estado de ânimo variável. Por exemplo, sentimentos de felicidade ou de tristeza que sejam passageiros são exemplos de humor. O humor normal flutua, oscila entre alegria, tristeza e irritabilidade, por exemplo.

Pesquisadores comprovaram que a prática de exercícios físicos pode alterar estados de humor. Por exemplo, pode diminuir o desânimo, a raiva, bem como aumentar disposição e a energia, tudo isso conferindo maior sensação de bem estar.

Nós vimos até agora, que a prática de exercícios físicos surte efeitos positivos, gerando bem estar psicológico. Vimos que, ao lado do tratamento psicoterápico e farmacológico, o exercício físico contribui para o tratamento das depressões e das ansiedades. Vimos ainda que o exercício físico atua sobre o estado de humor do sujeito, aumentando sua disposição, sua energia e diminuindo sua raiva ou seu mau humor.

Agora, por que será que o exercício físico promove todo esse bem estar psicológico? Segundo Weinberg & Gould (2001), Existem explicações fisiológicas e psicológicas.

As fisiológicas são:

Aumento no fluxo sanguíneo cerebral;
Mudanças nos neurotransmissores cerebrais;
Aumento no consumo máximo de oxigênio e liberação de oxigênio para os tecidos cerebrais;
Reduções na tensão muscular;
Mudanças estruturais no cérebro.

As psicológicas são:

Dar “um tempo” ou esquecer de problemas cotidianos;
Sensação de controle aumentada;
Sentimentos de competência e auto-eficácia;
Interações sociais positivas;
Melhora no auto conceito e na auto-estima.

Diante do exposto, podemos concluir que a prática regular e orientada de exercícios físicos traz benefícios de ordem psicológica ao ser humano, bem como se configura num plus no tratamento de transtornos de humor ou de ansiedade.

E você? Já se exercitou hoje?


KARINA ALECRIM BESSA

terça-feira, 10 de agosto de 2010

O Louco - Gibran Khalil Gibran

Perguntais-me como me tornei louco. Aconteceu assim:

Um dia, muito tempo antes de muitos deuses terem nascido, despertei de um sono profundo e notei que todas as minhas máscaras tinham sido roubadas – as sete máscaras que eu havia confeccionado e usado em sete vidas – e corri sem máscara pelas ruas cheias de gente gritando: “Ladrões, ladrões, malditos ladrões!”

Homens e mulheres riram de mim e alguns correram para casa, com medo de mim.

E quando cheguei à praça do mercado, um garoto trepado no telhado de uma casa gritou: “É um louco!” Olhei para cima, para vê-lo. O sol beijou pela primeira vez minha face nua.

Pela primeira vez, o sol beijava minha face nua e minha alma inflamou-se de amor pelo sol, e não desejei mais minhas máscaras. E, como num transe, gritei: “Benditos, benditos os ladrões que roubaram minhas máscaras!”

Assim me tornei louco.

E encontrei tanto liberdade como segurança em minha loucura: a liberdade da solidão e a segurança de não ser compreendido, pois aquele que nos compreende escraviza alguma coisa em nós.

(The Madman, Gibran Khalil Gibran, 1977)


KARINA ALECRIM BESSA


sábado, 7 de agosto de 2010

Loucura X Normalidade.

"A arte de ser louco é jamais cometer a loucura de ser um sujeito normal." (Raul Seixas).

O que é loucura?

O Grito (1893) -  Edvard Munch

A sociedade insiste em dividir as pessoas em dois grandes grupos: loucos e normais. Mas qual seria a gradação entre normalidade e loucura? Os tradicionais conceitos de normalidade / loucura costumam ser fechados, superficiais, utópicos e estigmatizantes.

Muitas vezes, para se submeter ao conceito de normalidade, o sujeito precisa abrir mão de sua porção racional. Sim, pois não raramente pensar é considerado insano ao incitar o questionamento.

Nos termos do dicionário Houaiss, loucura é “um distúrbio da mente do indivíduo que o afasta de seus métodos habituais de pensar, sentir e agir”.

Da referida definição poderíamos inferir que quando o sujeito se afasta de sua verdadeira essência, abrindo mão de ser quem realmente é para ser simplesmente aceito, sentindo-se parte integrante de um meio social que impõe regras ditatoriais de comportamento com a exigência clara de que abra mão de refletir (!), está louco. Mas esse, para a sociedade, é o sujeito “normal”.

Até agora manifestei apenas minha opinião pessoal acerca de normalidade versus loucura. Mas deixemos minha visão filosófica e voltemos, agora, nosso olhar para a psicopatologia, ciência que estuda o adoecimento mental. Sim, pois é muito comum a associação pejorativa do doente mental ao termo “louco”.

  Auto retrato com a Orelha Cortada (1889) - Vincent van Gogh.

O conceito de normalidade em psicopatologia está atrelado a saúde mental, mas também apresenta-se repleto de controvérsias. São vários os conceitos utilizados para definir normalidade em psicopatologia, conforme bem enumera Dalgalarrondo (2008). Vejamos:

1. normalidade como ausência de doença. De acordo com esse conceito, quem não possui uma enfermidade mental, seria saudável. Temos aqui um conceito fechado e falho, fincado numa definição negativa (ausência da doença);

2. normalidade como sinônimo de bem estar. Este conceito é da OMS (1946), mas guarda alto grau de utopia, pois para ser saudável o sujeito precisa apresentar bem estar completo: físico, mental e social. Percebe-se que poucos se enquadrariam nesse conceito;

3. normalidade estatística. Aqui a normalidade teria um conceito de fenômeno quantitativo. O normal passa a ser aquilo que se observa com mais freqüência, o que torna esse conceito bastante questionável, pois nem tudo que é raro é patológico;

4. normalidade funcional. Aqui o fenômeno não é quantitativo e sim funcional, ou seja, sempre que é disfuncional e produz sofrimento ao sujeito, o fenômeno é patológico;

5. normalidade como um processo. Aqui se consideram processos dinâmicos do desenvolvimento psicossocial, das desestruturações e reestruturações ao longo do tempo;

6. normalidade subjetiva. Aqui a ênfase é dada na percepção subjetiva do próprio sujeito em relação ao seu estado de saúde. Esse critério é questionado, pois muitos sentem-se bem e se consideram saudáveis, mesmo estando doentes;

7. normalidade como liberdade. Este conceito vem da fenomenologia existencial, onde os autores consideram que a doença mental seria decorrência da perda de liberdade existencial. O adoecimento mental seria o constrangimento do ser, o fechamento das possibilidades existenciais;

8. normalidade operacional. Este é um conceito arbitrário, onde se define previamente o que é normal e patológico, trabalhando-se operacionalmente com tais conceitos.

Após tal enumeração, Dalgalarrondo (2008) conclui que os critérios de normalidade e de doença em psicopatologia variam em função dos fenômenos que são trabalhados e de acordo com as opções filosóficas do profissional. Também chama a atenção para a necessidade dos profissionais de saúde mental manterem uma constante postura crítica e reflexiva acerca de tais parâmetros.

A loucura talvez seja realmente perder a razão. Mas perder a razão é uma questão de ponto de vista. Chamar o doente mental de louco é grosseiro e pejorativo. Porém, há quem use o termo para se referir a algo positivo, admirável, genial. Quanta controvérsia... tudo depende mesmo da subjetividade de cada um, do aspecto sob o qual se desenha um conceito, um paradigma.

Acredito que a sanidade esteja na capacidade de respeitar o outro e a si mesmo, de desenvolver empatia e de jamais abrir mão de sua própria essência, de ser quem simplesmente se é. Em precisando ser a sanidade algo diverso disso, fico com o brilhantismo de Lya Luft:

“Apesar do medo, escolho a ousadia.
Ao conforto das algemas, prefiro a dura liberdade.
Vôo com meu par de asas tortas, sem o tédio da comprovação.
Opto pela loucura, com um grão de realidade: meu ímpeto explode o ponto,
Arqueia a linha, traço contornos para os romper.
Desculpem-me, mas devo dizer: eu quero o delírio.”
Lya Luft.


Direitos autorais reservados.

KARINA ALECRIM BESSA




quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Qual a diferença entre psicólogo, psicanalista e psiquiatra?

Recentemente, me dei conta que essa é uma dúvida muito corriqueira entre as pessoas de um modo geral, daí a necessidade de elucidação. Vejamos:

Psicólogo é o profissional com graduação (curso universitário) em Psicologia. Este profissional pode se dedicar à área clínica ou não. A Psicologia possui um diversificado leque de segmentos e especializações, tais como:

• Psicologia Organizacional: Aqui a psicologia é aplicada aos contextos organizacionais, ou seja, em empresas. O psicólogo organizacional trabalha em processo de seleção de pessoal, bem como, nos processos de interação e comportamento dos membros daquela organização.

• Psicologia Escolar: Aqui temos a aplicação da psicologia no estudo da aprendizagem, motivação, avaliação, comportamento e processos de interação dentro das escolas. Atualmente muito se tem ouvido falar da importância do psicólogo escolar no sentido de evitar que a escola se torne um ambiente hostil, com a incidência do tão comentado bullying .

• Psicologia Jurídica: os psicólogos que se dedicam a essa área da psicologia, realizam estudos acerca do comportamento daqueles que descumprem os preceitos legais. Há processos de avaliações de condenados, suspeitos e testemunhas, bem como assistência psicoeducativa aos que estão cumprindo penas.

• Psicologia Clínica: Esta é a área da psicologia que está ligada a prática e investigação dos processos mentais, do comportamento e da psicopatologia. O psicólogo clínico pode trabalhar com avaliações psicológicas (aqui temos também uma área específica da psicologia, qual seja a neuropsicologia) e trabalha com psicoterapia, que pode ter várias orientações: psicanalítica, cognitiva, humanista, fenomenológica-existencial, etc. A formação psicoterápica é obtida por meio de curso de especialização a nível de pós-graduação.

Psicanalista é o profissional com formação em psicanálise. Este profissional não precisa ser psicólogo, ao contrário do que muitas pessoas pensam. Para ser psicanalista é preciso ter um curso superior e realizar a formação em psicanálise. As escolas da psicanálise são variadas, dentre as quais podemos citar: freudiana, lacaniana, kleiniana, winnicottiana, etc.

Psiquiatra é o médico com especialização em psiquiatria. O psiquiatra não é necessariamente psicoterapeuta. A função básica do psiquiatra é a de todo médico: diagnosticar um adoecimento (que neste caso é mental) e prescrever a medicação necessária. Alguns psiquiatras são também psicoterapeutas, para tanto realizam formação (especialização) em psicoterapia, na linha de sua preferência (psicanalítica, cognitiva, humanista...).

Esta semana, uma amiga me perguntou qual seria a diferença entre fazer psicoterapia com um psicanalista e com um psicólogo. Após realizar os esclarecimentos acima, respondi que a escolha de um psicanalista (que pode ser também psicólogo, conforme já vimos) ou de um psicólogo que segue outra linha psicoterápica depende do que a pessoa procura e precisa. Por exemplo, em casos de sintomatologia (adoecimentos) como síndrome do pânico e depressão, por exemplo, o mais indicado é a terapia cognitiva. Em situações onde o sujeito pretende realizar um processo de auto conhecimento e dispõe de mais tempo para investir no processo, talvez a linha psicanalítica fosse mais indicada. Mas, e o psiquiatra? Quando ele deve ser procurado?

As doenças psíquicas possuem, via de regra, dois tratamentos básicos:

1. Psicoterapia;
2. Farmacoterapia.

A psicoterapia nós já vimos quem são os profissionais que podem realizá-la. A farmacoterapia fica ao encargo do psiquiatra. Geralmente, os pacientes chegam aos consultórios psiquiátricos por encaminhamento de outros profissionais, médicos ou psicoterapeutas (não psiquiatras).


Direitos autorais reservados.

KARINA ALECRIM BESSA

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Transtornos Alimentares

A obsessão por um corpo perfeito tem sido causa de adoecimento e morte de milhares de pessoas, especialmente mulheres jovens, no mundo inteiro. A exaltação da magreza extrema, bem como a busca incessante de um corpo perfeito fundada em imagens irreais muitas vezes produzidas pelo famoso foto shop, costumam ser a válvula propulsora do surgimento dos transtornos alimentares.

O DSM-IV-TR (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) da American Psychiatric Association, classifica no rol dos transtornos alimentares:

1. Anorexia;
2. Bulimia;
3. Transtornos alimentares sem outra especificação, onde encontramos o chamado Binge Eating (TCAP – transtorno de compulsão alimentar periódica).

A obesidade simples é incluída na Classificação Internacinal de Denças (CID) como condição médica geral, não aparecendo no DSM-IV.
                                                                                
ANOREXIA

Consiste num transtorno alimentar onde o sujeito se recusa a manter o corpo em peso normal, aliada a um grande pavor de engordar e uma percepção significativa da forma ou do tamanho real do corpo, em razão do que os outros percebem que o sujeito está muito mais magro do que o normal, mas ele considera seu peso e comportamento de restrição alimentar completamente normais.

A anorexia possui dois subtipos:

1. Tipo Restritivo
2. Tipo Compulsão Periódica/Purgativo.

Alguns devem estar-se perguntando: “compulsão alimentar periódica e comportamento purgativo não são da bulimia”? Importante elucidar que na bulimia, transtorno que abordaremos mais adiante, há episódios recorrentes de compulsão alimentar e purgação, mas, ao contrário da anorexia do tipo compulsão periódica/purgativo, os bulímicos são capazes de manter o peso corporal normal ou até um pouco acima.

A anorexia tem maior prevalência em países industrializados e desenvolvidos, onde os padrões de beleza exigem um corpo esbelto. As mulheres sofrem bem mais de anorexia do que os homens, embora estes também possam apresentar o transtorno.

O início da anorexia se dá na adolescência (entre 14 e 18 anos), sendo muito raro seu aparecimento em pré-púberes. Também é raro o surgimento da doença em mulheres acima de 40 anos.

O curso da anorexia é bastante variável. Alguns pacientes apresentam um único episódio ao longo da vida, com total recuperação. Outros, vivem em quadro crônico de anorexia, adotando-a como estilo de vida, o que se percebe em muitas celebridades internacionais. Há ainda quem apresente flutuações no curso da anorexia, alternando ganho de peso e recaídas.

Vale trazer a lume que alguns pacientes, portadores do subtipo restritivo, podem desenvolver um comer compulsivo. Neste momento o paciente migra do subtipo restritivo para o subtipo compulsão periódica/purgativo, podendo ter o diagnóstico modificado para a bulimia nervosa.

A internação pode ser fazer necessária para hidratação e nutrição do paciente. A morte de pacientes hospitalizados é de mais de 10%, nos termos do DSM-IV-TR.

BULIMIA

A bulimia consiste num transtorno alimentar onde estão presentes episódios freqüentes de compulsão alimentar, seguidos de métodos compensatórios (indução de vômitos, uso de laxantes, diuréticos, jejuns, exercícios excessivos). O paciente portador de bulimia também é muito rígido na avaliação do próprio corpo e peso. Para que o transtorno possa ser diagnosticado, as compulsões alimentares e os comportamentos compensatórios devem ocorrer ao menos duas vezes por semana por 3 meses.

A bulimia possui dois subtipos:

1. Tipo Purgativo: Aqui o indivíduo se vale de indução de vômitos, laxantes, diuréticos;
2. Tipo Não Purgativo: neste subtipo o indivíduo se vale de jejuns ou exercícios excessivos como métodos compensatórios.

A bulimia é mais prevalente entre adolescentes e mulheres jovens, apresentando uma taxa de incidência de 1 a 3%. Em homens a ocorrência é de um décimo da que ocorre em mulheres.

As crises de bulimia costumam aparecer entre ou após um episódio de dieta restritiva. A bulimia costuma ser duradoura, onde o paciente mantém o comportamento por vários anos. O curso pode ser crônico ou intermitente, alternando remissão e crises recorrentes.

TRANSTORNO DA COMPULSÃO ALIMENTAR PERIÓDICA (BINGE EATING)

O Transtorno de Compulsão Alimentar  Periódica (TCAP) é uma patologia de diagnóstico relativamente recente. O termo comer compulsivo surgiu na década de 1950, na Universidade da Pensylvania, cunhado por Albert Stunkard. Mas, essas pesquisas foram esquecidas, nos termos de Fairburn em Overcoming Binge Eating (1995), até meados dos anos 1980, quando o trabalho realizado por um grupo de pesquisadores da Columbia University, liderados por Robert Spitzer, concluiu pela existência de um transtorno alimentar que possuía a compulsão como característica, mas se distinguia da bulimia. Este transtorno foi chamado inicialmente de pathological overeating syndrome, posteriormente cunhado como binge eating disorder. No ano de 1994, o transtorno foi incluído no DSM-IV, na categoria transtorno alimentar sem outra especificação.

Segundo Ballone (psiqweb.med.br), o TCAP aparece em aproximadamente 2% da população geral. Cordás (2008), elucida que, no Brasil, segundo Appolinario, Coutinho, Povoa e Borges, a prevalência de TCAP é de 15 e 22% em pacientes que procuram tratamento para emagrecer.

O paciente com TCAP apresenta crises bulímicas sem o uso regular de comportamentos compensatórios, característicos da bulimia.

O TCAP, assim como a bulimia, é considerado um Transtornos do Impulso. A impulsividade, nos termos de Tavares (2008), é considerada uma característica de comportamento marcada por reações rápidas e não planejadas, em que a avaliação das conseqüências não é realizada, ou é apenas de forma parcial, focando-se preferencialmente em aspectos imediatos em detrimento das consequências de longo prazo.

A principal característica do TCAP é o comer compulsivo. O paciente não consegue controlar sua impulsividade e come descontroladamente. Nos termos de Fairburn em Overcoming Binge Eating (1995), um episódio de TCAP é caracterizado por:

1. Comer, em curto período de tempo (por exemplo, entre um período de duas horas), uma quantidade de comida que é muito superior do que a maioria das pessoas comeria no mesmo período e sob as mesmas circunstâncias;
2. Sentir que perde o controle quando inicia um episódio de compulsão alimentar.

A perda de controle é realmente central no TCAP e ao contrário dos anoréxicos e bulímicos, os portadores de TCAP, conforme elucida Joyce Nash em Binge no More (1999), não almejam estar abaixo do peso, mas ficariam felizes em apresentar peso corporal normal.

TRATAMENTO DOS TRANSTORNOS ALIMENTARES

O tratamento dos transtornos alimentares deve ser realizado por uma equipe multidisciplinar. Esta deve ser composta por: psicólogo (habilitado a trabalhar com a TCC), psiquiatra, nutricionista (especializado em transtornos alimentares) e educador físico.

O tratamento da anorexia costuma ser particularmente difícil, pois a maioria dos pacientes não se reconhece doente e considera a anorexia um estilo de vida. Daí a necessidade da participação da família no processo.
Ainda no que tange à anorexia, Mônica Duchesne, da PUC/RJ, em publicação na Revista Brasileira de Psiquiatria, elucida que as estratégias sugeridas para o tratamento da anorexia objetivam a diminuição da restrição alimentar e da freqüência de atividade física, facilitando o aumento do peso; a diminuição do distúrbio da imagem corporal; a modificação do sistema disfuncional de crenças associadas à aparência, peso e alimentação e o aumento da auto-estima.

Tanto a anorexia, quanto a bulimia e o TCAP são tratados por meio de psicoterapia e de medicação. A psicoterapia Cognitivo Comportamental é a que apresenta melhores resultados, conforme coloca Cordás (2008).

ENDEREÇOS ÚTEIS:

AMBULIM – Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
Rua Dr. Ovídeo Pires de Campos, 785 (2º andar) – São Paulo.
Tel.: 11-3069-6975
Site: www.ambulim.org.br

PROATA - Programa de Orientação de Assistência aos Pacientes com Transtornos Alimentares – UNIFESP.
Rua dos Otonis, 887 – São Paulo.
Tel.: 11-5579-1543
Site: www.unifesp.br

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