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sábado, 31 de julho de 2010

Qual o perfil de quem almeja ser psicoterapeuta?

O psicanalista Contardo Calligaris em seu livro Cartas a um Jovem Terapeuta  apresenta alguns traços de caráter que ele gostaria de encontrar em quem quisesse se tornar psicoterapeuta, vejamos:

1. Um gosto pronunciado pela palavra e pelas pessoas, por mais diferentes que sejam de você.  Aqui o autor sugere visitas a hospitais psiquiátricos e a pacientes terminais e assume sua simpatia pelas “sarjetas da vida”, propondo inclusive um teste que consiste em conversar com desassistidos, a exemplo dos moradores de rua, deixando-os falar, ouvindo o que só quem escuta são os psicoterapeutas dos Centros de Atenção Psicossocial.

2. Uma extrema curiosidade pela variedade da experiência humana com o mínimo possível de preconceito. Calligaris nos alerta quanto ao fato de que, embora não seja a preocupação moral estrangeira ao trabalho do psicoterapeuta, o bem e o mal de uma vida não se decidem a partir de princípios preestabelecidos para um psicoterapeuta; se decidem na complexidade da própria vida que se trata.

3. Este ponto é controvertido: além de uma grande e indulgente curiosidade pela variedade da experiência humana, o futuro terapeuta deve ter, nessa variedade, uma certa "quilometragem rodada". Aqui, o autor chama nossa atenção para o fato de que o psicoterapeuta não precisa ser um modelo de normalidade, o que traz grande alívio a todos nós, estudantes de Psicologia e aspirantes à profissão de psicoterapeuta.

4. O quarto e último traço é uma boa dose de sofrimento psíquico. O autor desaconselha a profissão a quem está “muito bem, obrigada” por duas razões. Primeiro, porque o terapeuta precisará ser paciente, se submeter à terapia durante um bom tempo. Em segundo lugar, o autor não consegue conceber um futuro psicoterapeuta sem uma boa dose de sofrimento psíquico porque é preciso que o psicoterapeuta tenha vivenciado a sua própria história de melhora e superação na sua própria terapia para acreditar na eficácia da psicoterapia quando se deparar, por exemplo, com pacientes que não melhoram.

O livro se desenrola narrando respostas de Calligares a cartas/bilhetes de um jovem terapeuta e no Bilhete Quatro, surge a seguinte questão: “Será que não deveríamos acrescentar, entre os traços de caráter esperados num terapeuta, uma vontade de mexer com a vida dos outros, de ensiná-los, influenciá-los?”

Calligaris afirma que um terapeuta não deve ter grandes vocações pedagógicas e esclarece que o terapeuta precisa respeitar o desejo do paciente. Essa é, aliás, uma das razões pelas quais a terapia demora. É preciso que o terapeuta identifique os desejos do paciente para poder empurrá-lo naquela direção.

Mas e o primeiro paciente?

Calligaris nos relata sua insegurança diante de seu primeiro paciente. Narra que tentou camuflar de todas as formas o fato de que aquele era seu primeiro atendimento. Cuidou até de desarrumar o acolchoado do divã, colocar baganas de cigarro no cinzeiro (na época a França inteira fumava), no intuito de mostrar que ali já havia atendido outros pacientes. Esse primeiro paciente realizou sua análise com o autor por sete anos. Tratava-se de um jovem psiquiatra, que se tornou analista.

Anos mais tarde, Calligaris reencontra seu antigo paciente num congresso e este pergunta: “eu fui seu primeiro paciente, não fui”? Diante da mudez do autor, o paciente continuou explicando que havia solicitado à pessoa que o encaminhou um terapeuta iniciante.

Ao final do capítulo, o autor enumera alguns ensinamentos:

1. Nem sempre é verdade que os pacientes preferem terapeutas experientes;

2. Como os caminhos pelos quais um paciente coloca sua confiança num terapeuta são muitos, se não são inúmeros, o mais simples talvez seja que nos contentemos em ser nós mesmos (não é preciso desarrumar colchas e deixar baganas nos cinzeiros);

3. A experiência certamente ajuda na conduta das curas, mas seria bom que guardássemos sempre alguns elementos do espírito do debutante: a curiosidade, a vontade de escutar e, por que não, o calor de quem, a cada vez, acha extraordinário que alguém lhe faça confiança.


Direitos autorais reservados.

KARINA ALECRIM BESSA


Envelhecimento e Cognição

Desde o nascimento, a vida se desenrola em etapas distintas. Cada uma com características próprias. O desenvolvimento, segundo Erik Erikson, um psicanalista nascido na Alemanha em 1902 e falecido nos Estados Unidos aos noventa e dois anos de idade, avança em estágios (oito ao todo). Os primeiros cinco estágios ocorrem durante o período de bebê e da infância, e os últimos durante os anos adultos e a velhice. A mais recente síntese de Erikson sobre os estágios foi apresentada em O ciclo de Vida Completo (1995). Erikson, diferentemente de Freud, descreve os estágios em psicossociais e não psicossexuais (HALL, Calvin S., LINDZEY, Gardner & CAMPBELL, John, 2008).

A velhice constitui o último estágio da vida humana e nos termos de Erikson corresponde ao oitavo estágio, um estado que a pessoa atinge depois de ter cuidado de coisas e pessoas, produtos e ideias e de ter-se adaptado aos sucessos e fracassos da existência. Por meio dessas realizações, os indivíduos podem colher os benefícios dos primeiros sete estágios da vida e perceber que sua vida teve certa ordem e significado dentro de uma ordem maior. Esse seria o chamado estado de integridade na velhice. A contraparte essencial da integridade seria o desespero, o vazio da existência diante da morte. A virtude resultante do encontro da integridade e do desespero seria a sabedoria. Assim, quando o envelhecimento ocorre com sentimento de satisfação e valorização do que foi vivido, quando não há arrependimentos e lamentações sobre possibilidades perdidas ou desacertos inevitáveis haverá integridade e ganhos; ao contrário, um sentimento de vazio de tempo desperdiçado e a impossibilidade de recomeçar gera tristeza e desespero (HALL, Calvin S. , LINDZEY, Gardner & CAMPBELL, John, 2008).

A Organização Mundial de Saúde (OMS) classifica o envelhecimento em quatro estágios: meia idade (de 45 a 59 anos); idoso (de 60 a 74 anos); ancião (de 75 a 90 anos) e a velhice extrema (acima de 90 anos). Há ainda uma diferença de idade no início da velhice para países desenvolvidos e em desenvolvimento. A definição de idoso se inicia aos 65 anos de idade nos países desenvolvidos, e aos 60 anos nos países em desenvolvimento. No Brasil, de acordo com o Estatuto do Idoso, as pessoas com idade igual ou superior a 60 anos são reconhecidas como idosas. (Organização Mundial de Saúde – OMS, www.who.org).

Numa visão biológica, nos termos de HAMILTON (2002), o envelhecimento é o estágio final do desenvolvimento, que todo indivíduo sadio e que não sofreu acidentes vai atingir. Nesse período, ocorrem inúmeras mudanças corporais e um espectro notável é a perda de células, que, vale frisar, não se inicia na velhice e sim na idade adulta.

Numa visão cognitivista, o envelhecimento, assim como as demais etapas da vida, é um processo de transformação do organismo que se reflete nas suas estruturas físicas, nas manifestações da cognição, bem como na percepção subjetiva dessas transformações. Se envelhecer é mudar, tais mudanças, entre elas as cognitivas, precisam dirigir-se para uma melhor qualidade de vida (PARENTE, Maria Alice de Mattos, 2006).

As colocações retro nos remetem ao fato de que o envelhecer provoca inevitáveis mudanças, de natureza física, psicológica, cognitiva e neurológica. Quanto à mudança neuronal, HAMILTON (2002) nos traz que os pesquisadores concordam que o cérebro diminui de peso em 10% a 15% no curso do envelhecimento normal, o que repercute no funcionamento psicológico, principalmente porque os neurônios do SNC provavelmente não são substituídos, embora existam estudos científicos tentando provar o contrário.

O mesmo autor traz a lume que as razões dessa perda neuronal ainda não são claras e podem decorrer de inúmeras razões, variando de pessoa para pessoa. Uma possível causa pode ser o baixo fluxo de sangue no cérebro, o que levaria os neurônios a morrerem por falta de oxigênio. Outra explicação é o fato de que muitas pessoas em idade mais madura sofrem pequenos derrames ou infartos, através dos quais uma minúscula porção do cérebro se atrofia devido ao desaparecimento do suprimento sanguíneo local. Uma terceira explicação é que o suprimento sanguíneo do cérebro, quando operando eficientemente, filtra possíveis toxinas do sangue, antes que cheguem ao cérebro, por um mecanismo chamado barreira hematoencefálica e quando o envelhecimento causa declínio desse mecanismo, o cérebro estará exposto a toxinas potencialmente danosas. Geralmente, esses declínios no metabolismo e problemas cardiovasculares significam que, mesmo não havendo morte de neurônios, eles recebem menos oxigênio e glicose sanguínea e não conseguem operar tão eficientemente. Entretanto, as principais causas de declínio celular são as mudanças que ocorrem na fisiologia do próprio neurônio. Há controvérsias sobre se as células neurais morrem ou sobrevivem, mas não quanto ao fato de que elas diminuem de tamanho. Está documentado que, em muitas seções do cérebro, os neurônios encolhem na velhice e que diminui o número de conexões neurais.

Vale ressaltar, contudo, como bem expõe GEDIMAN (2005), que o cérebro é um órgão dinâmico, capaz de refazer conexões e se adaptar mesmo na velhice. O mesmo autor nos apresenta dados promissores no sentido de que o cérebro quando estimulado é capaz de criar reservas cognitivas e estimular os processos regenerativos.

O autor antes citado ainda coloca que recentemente os cientistas mapearam o genoma humano, clonaram ovelhas e até a superfície de Marte foi explorada. Em contraste, estão apenas começando a compreender os processos ligados ao envelhecimento do cérebro. Importante frisar, entretanto, que numerosos fatores estão confluindo no sentido de estimular a neurociência, dentre os quais o fato de que as pessoas estão vivendo mais, o que leva os profissionais a um número maior de cérebros em idade avançada para estudar e proteger.

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (www.ibge.gov.br), mostram que a vida média do brasileiro chegará ao patamar de 81 anos em 2050. Os avanços da medicina e as melhorias nas condições gerais de vida da população repercutem no sentido de elevar a média de vida do brasileiro (expectativa de vida ao nascer) de 45,5 anos de idade, em 1940, para 72,7 anos, em 2008, ou seja, mais 27,2 anos de vida. Segundo a projeção do IBGE, o país continuará galgando anos na vida média de sua população, alcançando em 2050 o patamar de 81,29 anos.

Não é somente no Brasil que se percebe esse processo de envelhecimento da população. Este acontece mundialmente e tem consequências diretas no sistema de saúde pública.

Diante do envelhecimento da população, os pesquisadores sentem-se instigados a investigar cada vez mais o cérebro humano. As alterações do sistema cognitivo que ocorrem quando a pessoa envelhece tem sido o foco dos psicólogos cognitivistas interessados no fenômeno do envelhecimento. Na maioria das vezes, como elucida PARENTE (2006), essa questão torna-se mais específica e focaliza uma ou várias funções. Entretanto, alguns pesquisadores procuram uma explicação mais abrangente sobre o envelhecimento. Eles buscam um fator responsável pelos declínios em algumas funções e não em outras.

Pesquisas avançam no sentido de identificar indivíduos com potencial de risco de desenvolver demência, pois o diagnóstico precoce das demências possibilita uma intervenção terapêutica precoce, podendo ser fundamental no prolongamento da autonomia do sujeito, bem como no retardo do processo demencial.

Envelhecer de maneira saudável é o que todos almejamos. A velhice pode ser normal, patológica e bem sucedida. Vejamos:

A velhice normal está em contraponto à velhice patológica. Nesta ocorrem doenças físicas e/ou mentais em grau muito mais intenso e grave do que na primeira, onde os adoecimentos ocorrem em intensidade leve ou moderada o suficiente para acarretar apenas mudanças parciais nas atividades cotidianas (PARENTE, Maria Alice de Mattos, 2006, p. 19).

A velhice bem sucedida revela-se em idosos que mantém autonomia, independência e envolvimento ativo com a vida pessoal, com a família, com os amigos, com o lazer, com a vida social. Revela-se em produtividade e em conservação de papéis sociais adultos. Traduz-se em auto-descrições de satisfação e de ajustamento. Reflete-se também em reconhecimento social às pessoas porque lhes permite oferecer contribuições à sociedade ou ao grupo familiar, proporcionando que sejam vistas como modelos de velhice boa e saudável. O número de pessoas capazes de atingir esse padrão é muito pequeno, pois além da genética, o estilo de vida e as condições socioeconômicas e culturais podem impor restrições ao alcance de tal resultado. No entanto, sua existência é útil para balizar as aspirações individuais e sociais e para sinalizar que velhice pode ser um período de desenvolvimento (YASSUDA, Mônica, 2005).

A velhice patológica ocorre quando se verificam impedimentos à funcionalidade, aumento da vulnerabilidade, comprometimento na possibilidade de adaptação e grandes perdas cognitivas. Decorre da interação entre causas genéticas e ambientais (YASSUDA, Mônica, 2005).

O termo cognição tem sido muito utilizado nos últimos tempos. Mas o que se entende por cognição? Cogniçãoa, nos termos de RAMOS (2005), constitui as várias dimensões da função intelectual, como memória, atenção, julgamento, abstração, orientação, linguagem, função executiva (solucionar problemas), praxia (executar gestos em uma sequência adequada) e gnosia (habilidade de reconhecer objetos e pessoas).

O autor supramencionado ainda nos traz que em virtude do crescimento da população idosa ocorre um aumento da prevalência dos quadros demenciais, principalmente em virtude da doença de Alzheimer, que é uma doença que ocorre na velhice. Nos termos do DSM-IV-TR (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders - Fourth Edition – American Psychiatric Association), estima-se se que dois a quatro por cento da população com mais de 65 anos apresentem Demência do Tipo Alzheimer. A prevalência aumenta com a idade, particularmente após os 75 anos.

Quanto ao curso da Demência do Tipo Alzheimer, ainda conforme o DSM-IV-TR, tende a ser lentamente progressivo, com uma perda anual de três a quatro pontos em um instrumento padronizado de avaliação, como o Mini-Exame do Estado Mental. Vários padrões deficitários são vistos, sendo um dos mais comuns o início insidioso, com déficits precoces na memória recente seguidos pelo desenvolvimento de afasia, apraxia e agnosia após vários anos. Alguns indivíduos podem apresentar alterações da personalidade ou maior irritabilidade nos primeiros estágios. Nos estágios posteriores da doença, os indivíduos podem desenvolver perturbações motoras e da marcha, podendo por fim ficar mudos e confinados ao leito. A duração média da doença a partir do início dos sintomas até a morte é de 8-10 anos.

Envelhecer com qualidade de vida, atingindo uma velhice bem sucedida é o que todos desejam. Alcançar esse intuito, contudo, depende de uma conjunção de fatores, físicos, genéticos, psicológicos, cognitivos e sociais. Vale colocar, que é possível trabalhar para alcançar uma velhice bem sucedida, conforme bem coloca YASSUDA (2005) e os pesquisadores são unânimes em afirmar que para tanto é preciso ter em mente que a palavra chave é prevenção.

Os déficits leves na capacidade cognitiva, nos termos de GEDIMAN (2005) decorrem de processos fisiológicos do envelhecimento normal ou podem ser um indício de um estágio de transição para as demências. Estudos epidemiológicos mostram que idosos com perdas na capacidade cognitiva apresentam maior risco de desenvolver Doença de Alzheimer, em particular aqueles com declínios na memória episódica.

A saúde pública atualmente possui um novo desafio, como bem elucida YASSUDA (2005), qual seja o de cuidar da população de idosos que como já demonstrado está aumentando e tende a crescer ainda mais. Vale lembrar que a maioria dessa população no Brasil possui baixo nível sócio-econômico e educacional e uma alta prevalência de doenças crônicas e incapacitantes.

Importante frisar que a Psicologia atualmente tem-se dedicado ao estudo do processo de envelhecimento. O papel do psicólogo é de alta relevância, pois as mudanças, já mencionadas, provocadas pelo advento da velhice provocam inevitavelmente uma certa vulnerabilidade ao sujeito. O papel do psicólogo pode se dar no processo de avaliação cognitiva no intuito de identificar possíveis perdas, bem como na reabilitação cognitiva. A psicoterapia de idosos, familiares e cuidadores, também é função do psicólogo. Como bem elucida YASSUDA (2005).

PARENTE (2006) esclarece que em geral, os indivíduos possuem uma percepção subjetiva do déficit que ocorre em seu funcionamento com o envelhecimento. A primeira função cognitiva onde se percebe uma perda em razão do processo normal de envelhecimento é a memória. As dificuldades de memória na vida adulta, particularmente no envelhecimento, constituem uma questão complexa da qual se interessam não apenas psicólogos, mas também outros profissionais, como neurologistas e neurocientistas.

Na maioria dos casos, o envelhecimento não se acompanha de alterações cognitivas graves. Mas, infelizmente, há situações graves, comumente em decorrência da já mencionada doença de Alzheimer. Entretanto, atualmente, é possível contar com o processo de intervenção cognitiva na prevenção e recuperação de déficits cognitivos leves ou graves, com bem coloca PARENTE (2006). O fundamento da intervenção cognitiva é a capacidade de regeneração do cérebro, a chamada plasticidade cerebral. Esta consiste numa mudança adaptativa na estrutura e nas funções do sistema nervoso, ou seja, um suporte orgânico à recuperação cognitiva.

Ademais, a intervenção cognitiva constitui-se em ferramenta para retardar o processo degenerativo inicial, principalmente quando utilizada em conjunto com terapias medicamentosas. O trabalho de intervenção cognitiva pode ser realizado de maneira individualizada ou em grupo. Ambas são úteis e complementam-se. A terapia individual proporciona direcionar o tratamento conforme a necessidade do paciente, de maneira particular e individualizada. A terapia em grupo proporciona um ganho social, pois o contato entre os pacientes favorece habilidades sociais e comunicativas e quebra a monotonia. Assim, o uso combinado de terapia individual e de grupo seria o ideal para um tratamento mais abrangente.

Entretanto, independentemente da forma de intervenção, YASSUDA (2005) elucida que o paciente deve passar primeiramente pelos processos de avaliação e investigação para diagnóstico, a fim de detectar se há e o quanto há de perdas cognitivas. A autora lista como elementos essenciais da avaliação do paciente com possíveis distúrbios cognitivos: investigação dos problemas atuais; nível de funcionamento cognitivo, por meio de avaliações neuropsicológicas; atividades sociais e ocupacionais; atenção ao uso de medicamentos; exame físico, a cargo do geriatra; exame neurológico, a cargo de um neurologista; exame psíquico, a cargo do psicólogo.

É cediço, como bem lembra RAMOS (2005) que a depressão pode manifestar-se no indivíduo idoso como um quadro de deficiência cognitiva. Os transtornos de ansiedade também afetam a cognição, daí a necessidade de um inventário de medição de depressão e ansiedade.
As baterias neuropsicométricas, como traz a lume YASSUDA (2005), possibilitam ainda verificar a progressão dos quadros demenciais, além de verificar o nível de benefício das intervenções. É importante a reavaliação do idoso que passa pelo processo de recuperação cognitiva no intuito de verificar o grau de melhora obtido, pois por meio dos dados obtidos nas avaliações periódicas é possível analisar as possíveis falhas e utilizar estratégias compensatórias. Não se pode esquecer, entretanto, que os processos demenciais são progressivos e a intervenção cognitiva não fará com que o indivíduo recupere seu funcionamento cognitivo anterior, mas oferecerá melhor qualidade de vida, enquanto impede o avanço do processo e investe no que ainda há preservado.


Direitos autorais reservados.

KARINA ALECRIM BESSA

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Ansiedade

Hoje estamos inaugurando nosso blog. Que alegria!
Nossa publicação de abertura será sobre ansiedade.

Mas, o que é ansiedade? Você sabe? Já sentiu o coração bater mais forte, as mãos suarem, o corpo tremer, o ar faltar?...

Sentir ansiedade não é necessariamente patológico. Isso significa que sentimentos ansiosos estão presentes na vida cotidiana de todo ser humano. Quem nunca sentiu o coração bater descompassado diante de uma situação nova ou desafiadora? Não há quem não vivencie tal situação, seja uma criança em seu primeiro dia na escola, seja um Chefe de Estado a tomar posse do novo cargo.

E não é apenas em situações desafiadoras que sentimos ansiedade. Esta tanto existe na vida de todos nós, quanto é necessária para nossa sobrevivência. É a ansiedade que nos alerta a solucionar um problema, a nos protegermos contra um perigo. Entretanto, quando a ansiedade ultrapassa certos limites, torna-se patológica e inflige grandes sofrimentos aos seus portadores.

Embora seja, a ansiedade, um espectro normal da vida psíquica do ser humano, ela se torna patológica quando é desproporcional ao foco que a gerou, ou quando persiste sem razão específica. Como bem coloca Sônia Del Nero (2002), quando a ansiedade ultrapassa os limites esperados transforma-se em desconforto.

Zimerman (2007), afirma que a ansiedade (aqui em sentido patológico) é o sinal mais evidente de algum sofrimento psíquico. Entretanto, como bem lembra Cassorla (2005), o limite entre a ansiedade normal e a patológica é muito tênue.

Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (Burden of Mental and Behavioural Disorders. The World Health Organization - Organização Mundial de Saúde – OMS), sintomas de ansiedade patológica estão presentes em grande número de pessoas nos dias atuais, principalmente nos grandes centros urbanos. Na cidade do Rio de Janeiro estima-se que 22,6% da população sofre de Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG).

Bourne (2008), relata que o ambulatório de ansiedade do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, em pesquisa recente, registrou que 25% da população brasileira sofre de algum transtorno de ansiedade.

Contudo é inegável que mesmo diante de catástrofes, desgraças e sofrimentos, alguns conseguem manter sua sanidade e seguem a vida sem maiores problemas. Outros, entretanto, sucumbem e adoecem diante das mesmas situações. Isto se deve ao fato, nos termos de Sônia Del Nero (2002), de que a quantidade de tensão que pode ser suportada por cada um, varia de indivíduo para indivíduo.

Melanie Klein (1946), defende que as ansiedades surgem muito cedo e que no nascimento já existe um ego rudimentar, que tanto experimenta como se defende da ansiedade.

Hoje é sabido que o ambiente contribui para a formação do psiquismo humano. É uma junção das pulsões (questões interiores) com as questões ambientais (a exemplo da função continente da mãe, defendida por Wilfred Bion) que formam o mundo interior e este poderá ser sadio ou patológico.

Bock (2008), em seu livro Psicologias, traz que o psiquismo, o mundo interior é construído a partir das interações sociais. A primeira interação social do homem se dá no seio da família, seguida da escola e assim sucessivamente.

É focado no mundo interior de cada um que devemos analisar as chances de manifestações patológicas. Lembrando que ainda quando há questões ligadas à genética, o que existe é apenas uma predisposição genética à manifestação de algumas doenças, mas os fatores ambientais serão os determinantes para suas manifestações.

Vejamos a seguir a classificação dos transtornos ansiosos, trazida pelo DSM-IV (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Americana de Psiquiatria):

Os transtornos de ansiedade, nos termos do DSM-IV (1995), podem ser classificados em:
1.Agorafobia – É a ansiedade ou esquiva a locais ou situações das quais poderia ser difícil escapar, nas quais o auxílio poderia não estar disponível;
2.Ataque de pânico - Período no qual ocorre súbita e intensa apreensão, temor ou terror. O sujeito sente medo de “ficar louco” ou de morrer. Também podem ocorrer individual ou simultâneamente palpitações, sensação de sufocamento, desconforto toráxico. Pode ocorrer com ou sem agorafobia;
3.Fobia específica – Ansiedade clinicamente significativa provocada por exposição a um objeto determinado;
4.Fobia social – Ansiedade provocada pela exposição a certos eventos sociais;
5.Transtorno obsessivo-compulsivo – Caracteriza-se por obsessões e/ou compulsões que causam considerável ansiedade e sofrimento psíquico;
6.Transtorno de estresse pós traumático – Caracteriza-se pelo reviver de evento extremamente traumático;
7.Transtorno de estresse agudo – sintomas similares ao anterior, ocorrendo após situação traumática;
8.Transtorno de ansiedade por condição médica geral – ansiedade em conseqüência de situações fisiológicas diretas de condição médica;
9.Transtorno de ansiedade induzido por substância – ansiedade decorrente do uso de drogas lícitas ou ilícitas, álcool ou toxina.
10.Transtorno de ansiedade generalizada - caracteriza-se por pelo menos seis meses de ansiedade e preocupações excessivas e persistentes.
11. Transtorno de ansiedade sem outra especificação – transtorno de ansiedade ou esquiva fóbica que não satisfaz os critérios para qualquer um dos transtornos de ansiedade específicos.

TRATAMENTO

O objetivo maior e primeiro do tratamento dos transtornos de ansiedade é minimizar os sintomas, tanto físicos quanto psíquicos, no intuito de reduzir o sofrimento do portador. Trabalha-se no sentido de fortalecer a resistência do portador aos estressores, bem como para corrigir a distorção do paciente no foco estressor.

A psicoterapia cognitivo-comportamental (TCC) é uma opção comprovadamente eficaz para tratamento de pacientes portadores de  transtornos de ansiedade. Ademais a TCC apresenta baixos índices de desistência, (BECK, 1997).

A TCC também mostra-se eficaz, pois é possível por meio desta forma psicoterápica, orientar o paciente a reconhecer e posteriormente substituir os chamados PAMS (pensamentos automáticos e disfuncionais) que, relacionados a algumas emoções, causam, muitas vezes as distorções cognitivas que iniciam e mantém a doença. (VOLPATO, 1998).

A psicoterapia de linha psicanalítica, embora mais longa, também é utilizada no tratamento dos transtornos de ansiedade. Cláudio Eizirik em Psicoterapia de orientação analítica (2005) propõe conduta diferenciada para ansiedades mais arcaicas e ansiedades flutuantes. Pacientes portadores de ansiedades mais arcaicas precisariam entrar em contato com a parte psicótica da personalidade, trazida a lume por Wilfred Bion, na qual os mecanismos de defesa mais primitivos, como identificação projetiva, idealização, dentre outros, encobrem as citadas ansiedades.

O tratamento farmacológico pode se fazer necessário e o psicólogo deve estar atento para encaminhar o paciente à avaliação médico-psiquiátrica sempre que preciso.


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KARINA ALECRIM BESSA